quarta-feira, 29 de abril de 2009

Sangue, muito sangue

Os primeiros filmes que vi do chamado cinema Gore foram, se não estou em erro, de Umberto Lenzi: “Comidos vivos” (1980) e “Canibal Feroz” (1981). Mas quem me convenceu a seguir este tipo de cinema com a maior das atenções foi o realizador americano Sam Raimi com a triologia Evil Dead, "A Noite dos Mortos Vivos" (1981), "A Morte Chega de Madrugada" (1987) e "O Exercito das Trevas" (1992). As pessoas que foram comigo ao cinema, saíram a meio do filme, pois acharam que aquilo “era uma palhaçada”. Sejamos justos, ou uma pessoa entra dentro do espírito do filme ou… uma mão ensanguentada a correr atrás das personagens, a dar-lhes estaladas e apalpadelas no rabo, não é para todos.

O cinema Gore é conhecido pelas exageradas cenas de desmembramentos vários, estripamentos, cabeças esmagadas, olhos furados, cérebros abertos e sangue, muito sangue. Filmes violentos existiram e sempre vão existir, mas o que torna o Gore irresistível são as suas imagens explícitas. Este tipo de filmes atrai as pessoas pelas suas cenas chocantes e de mau gosto. Enquanto uns se sentem seduzidos, outros poderão perguntar: "mas porque quero eu ver filmes com sangue e desmembramentos?" mas essa não é a questão. A questão é poder não vê-los, por opção. A escolha é sempre importante. Devemos poder escolher por nós, e não sancionar as escolhas de terceiros.

Amante deste tipo de cinema, passei a apreciar o género e vi: "A Noite dos Mortos-Vivos" (1968), “O Despertar dos Mortos” (1978); “O Dia dos Mortos” (1985) de George A. Romero; “Massacre no Texas” (1974) de Tobe Hooper; “Holocausto Canibal” (1980) realizado por Ruggero Deodato; “Bad Taste” (1987), “Meet the Feebles” (1989) e “Braindead” (1992) de Peter Jackson; “Suspira” (1977), “Inferno” (1980) e “Phenomena” (1985) de Dário Argento ; “Fogo Maldito” (1987) de Clive Barker; “A maldição dos mortos-vivos” (1988) foi o nome dado em português ao filme de Wes Craven, “The serpent and the rainbow”. Ainda bem que o filme não foi traduzido à letra, senão teria ido ao cinema com a minha filha a achar que ia ver um filme do principezinho.


sexta-feira, 24 de abril de 2009

Sopas de tomate

Após uma noite tranquila, a cidade volta a acordar para mais um dia. Uma a uma, as ruas vão-se enchendo de uma multidão incógnita. Os comerciantes apregoam os seus produtos, as lojas abrem as portas para receber os seus estimados clientes. Miúdos levados às escolas, graúdos a caminho dos empregos. Carros e mais carros invadem as ruas, até há uns minutos atrás desertas. As árvores abanam os seus ramos em direcção ao céu, perdendo algumas folhas pelo caminho. Tudo corre com normalidade na vida destas pessoas.

Ouve-se um estrondo ao longe, a terra treme um pouco. Mas passa despercebido aos habitantes desta cidade. Passam-se uns minutos… um novo tremor, desta feita bem sentido. As pessoas não sabem bem o que se passa. Param por uns minutos mas voltam à correria do costume.

Mas, de repente… o barulho é ensurdecedor, a terra parece fugir debaixo dos pés. Elas deixam de fazer o que estavam a fazer e a visão que lhes aparece é inimaginável. É aterrorizadora. É indescritível.

Elas correm. Elas fogem. Escondem-se… mas não há para onde ir. A cidade é tomada, e os corpos dos cidadãos, que outrora viviam naquela pacata cidade, amontoam-se ensanguentados pelas ruas. Cabeças abertas, membros dispersos, tripas esventradas, invadem a cidade sangrenta.

Não há como pará-los. Ninguém sabe o que fazer. Nem Estados ou governos. Nem exército ou marinha. O mundo está perdido.
Ninguém está a salvo. Esta cidade está tomada. Preparam-se agora para "ganhar tomates" e invadir outra.


terça-feira, 21 de abril de 2009

Gooooooolo!


Futebol não é bem o meu forte. Evidentemente que sou adepto de um clube. O meu avô era desse clube, o meu pai também é, e eu, ainda puto, acabei por me converter a esse mesmo clube.

Quando chego ao escritório no malfadado dia de Segunda-feira "levo" sempre com os meus colegas a falar da jornada do fim-de-semana. Eu não consigo acompanhá-los. Para além de não ter visto grande coisa, eles utilizam palavras e frases que desconheço, género: “domina o esférico e faz uma assistência; defesa homem a homem ou à zona; pontapé na atmosfera; meio-campo em losango…” por mim, até acho que deveria ter dado mais atenção às aulas de filosofia!

Apesar de não gostar, vou abrir uma excepção para o chamado desporto-rei, e falar de cinco filmes que têm importância naquilo a que me proponho. E não estou a falar da “Angústia do guarda-redes na altura do penalty” (1972) de Wim Wenders, cuja a única memória que tenho prende-se com a curiosidade que o título desperta.

Começo pelas senhoras: Bend it like Beckham (2002) do queniano Gurinder Chadha, que nos fala dos costumes indianos, e de como uma rapariga vai enfrentá-los, ao optar por uma carreira numa equipa de futebol feminino.




Dias de futebol (2003) do Espanhol David Serrano, em que quatro amigos com vidas desprovidas de qualquer interesse têm finalmente um objectivo comum: voltar a juntar a equipa de futebol que tinham na sua juventude.

Na maior (2000) do Inglês Mark Herman, onde dois amigos pobres e delinquentes, tudo vão fazer para conseguir um passe de época para assistirem aos jogos do Newcastle.

À semelhança de “Fuga para a vitória” (1981) de John Huston, A Máquina (2001) do realizador Barry Skolnick, conta-nos a história de alguns prisioneiros que se juntam e formam uma equipa para defrontar os guardas prisionais.

E por fim Stephen Chow traz-nos uma comédia de futebol "marcial" cheia de acção e efeitos especiais, Shaolin Soccer (2001).




Com tantas sugestões... só eu sei porque não fico em casa.

Reflexivo


Há quem diga que as crianças são cruéis. Que os mais fortes tendem a pôr de parte os mais fracos. Temos o exemplo disso na obra “O Senhor das Moscas" (Lord of the flies) do escritor William Golding, a partir da qual foram feitos três filmes.

Mas não precisamos de ler o livro, ou ver o filme para sabermos que isso é verdade. Todos nós, quando pequenos, púnhamos de parte aquelas crianças que, por algum motivo, se diferenciavam: tinham óculos, eram gordas, tinham um defeito físico, gaguejavam… Enfim, ou eram "normais" ou estavam tramadas. Mas afinal, no homem prevalece a maldade ou a bondade intrínsecas?

Quem não escapa à maldade dos miúdos, é certo, são os animais. O gozo que me dava meter uma palha pelo rabo de um moscardo, para ele voar sempre em frente, indo contra o que lhe aparecesse no caminho... meter cascas de nozes nas patas dos gatos, largá-los nas descidas de alcatrão e vê-los sem qualquer controlo até esbarrarem contra um muro... ou mesmo agarrar num sapo e meter-lhe um cigarro aceso na boca e esperar que ele explodisse.

Não fui o primeiro, nem serei o último a cometer tais "atrocidades".

“A Criança Espelho” (1990 The reflecting skin), do realizador inglês Philip Ridley começa onde eu acabei. Três miúdos agarram um sapo, enchem-no de ar e, com uma fisga, fazem explodir o animal. O filme é passado numa aldeia rural na década de 50, e conta a experiência de vida de um adolescente onde sexo, violência e morte são uma constante. Não encontrando uma explicação para as coisas, deturpa a realidade, levando-o a pensar que a vizinha Dolphin Blue (Lindsay Duncan), com quem o irmão (Viggo Mortensen) namora, é vampira e anda a matar as pessoas da comunidade.

Na fase da adolescência, ou nos deixamos levar pelo "faço o que gosto", seguindo a fantasia, ou se decide com sabedoria "faço o que me faz bem". À velha questão: "o homem é bom ou mau?" o jovem Seth Dove (Jeremy Cooper) responde com o reflexo da sua própria adolescência.


quinta-feira, 16 de abril de 2009

Quem canta seus males espanta

Enquanto o fumo esvoaça à minha frente os meus olhos perdem-se no infinito, e tudo passa pela minha mente. Nesta altura, perdido em sonhos, sou capaz de vasculhar a minha mente e ir ao encontro de sentimentos aí guardados. E como expressar esses sentimentos?

John Turturro encontrou, na sua terceira longa-metragem, a maneira de as suas personagens expressarem os sentimentos mais profundos. Todos elas falam, conversam, dialogam, mas quando chega a altura de expressarem os seus sentimentos mais profundos... cantam.

Para demonstrar como ele descobriu que a mulher o traía Cousin Bo (Christopher Walken) canta “Delilah”, ao som de Tom Jones marcando um dos momentos altos do filme (vejam o clip).

“Romance & Cigarros” (2005) é um filme sobre a realidade vivida pela classe trabalhadora, em que o dia-a-dia é retratado através da música. James Gandolfini, Susan Sarandon, Kate Winslet, Steve Buscemi, Christopher Walken, Mary-Louise Parker, Eddie Izzard, Adam LeFevre são alguns dos actores que levam este filme a bom porto.


terça-feira, 14 de abril de 2009

De perder a cabeça

O trabalho do cineastra Sam Peckinpah é para mim um dos mais fascinantes que tive oportunidade de conhecer. Filmes como: Major Dundee (1965), Quadrilha Selvagem (1969), Cães de Palha (1971), Junior Bonner (1972), Pat Garret & Billy the kid (1973), Cruz de Ferro (1977) ou Combóio dos Duros (1978), encheram-me as medidas. Mas existe um filme que talvez não seja tão conhecido: Tragam-me a Cabeça de Alfredo Garcia (1974).

Alfredo Garcia fica com a cabeça a prémio ao engravidar a filha de um homem poderoso. O pai oferece um milhão de dólares pela sua cabeça. Bennie (Warren Oates) descobre que este já está morto. Corta-lhe a cabeça para receber a recompensa e desse modo, pôr termo à sua vida oca de sentido. O problema é que há muita gente atrás dessa cabeça!

Vamos assistir à viagem de um saco putrificado, que vai rodando de mão em mão, enquanto a sala de cinema alberga o cheiro nauseabundo de carne em decomposição e sentimos na pele o som das larvas a invadirem a cabeça do morto. Tais sensações ficaram gravadas na minha mente e já vi o filme há mais de 20 anos.


Como animar uma pessoa

A minha namorada na altura, hoje minha mulher, andava um pouco em baixo. Lembrei-me de fazer qualquer coisa para a animar. O dia estava cinzento e chuvoso. Vamos ao cinema, pensei. Como ela andava a estudar alemão, resolvi escolher um filme falado nessa língua. Ao entrar na sala ela já estava mais bem disposta até... até o filme começar. Escolhi nada mais nada menos que "Funny Games" (1997), do austríaco Michael Haneke, sem ter noção do que iria assistir.

Dois rapazes psicologicamente desequilibrados entram em casa de uma família fazendo reféns pai, mãe e filho. Usam-nos nos seus jogos sádicos. Desde amarrarem, baterem, violarem e matarem, há-de tudo. Um filme que incomoda e cativa, ao ponto da Joana o suportar até ao fim.

Como podem imaginar, ela saiu de lá um pouco perturbada, mas não foi assim tão grave, pois casou comigo na mesma.

Passados estes anos, estou a tentar arranjar o remake que Michael Haneke fez do mesmo filme, para podermos ver em família, se a Joaninha ainda suportar...

domingo, 12 de abril de 2009

À porta do céu


Já lá vai o tempo em que nos punham em colégios internos e só nos viam no Verão. Já lá vai o tempo em que só podíamos fazer aquilo que as professoras, a maior parte das vezes freiras, mandavam. E o tempo em que as crianças abandonadas em orfanatos eram mal tratadas, já lá vai... ou não?

"As Irmãs de Maria Madalena" (2002 The Magdalene Sisters), realizado pelo actor/realizador Peter Mullan, é baseado em factos verídicos e descreve um desses conventos. As raparigas eram enviadas pelas próprias familias ou por outros orfanatos, para aí terem uma educação, supostamente, mais adequada. Para satisfação dos seus próprios caprichos as freiras obrigavam-nas a todo o tipo de castigos e aplicavam penas brutalmente severas, alimentando o seu sádico ego. Muitas dessas mulheres acabaram por morrer no próprio convento, cativas na sua angústia e sem nunca terem vivido.

Claro está que estamos a falar do século passado. Não, não me refiro ao século XIX. O último convento deste tipo fechou, na Irlanda, há pouco mais de dez anos.

Filme premiado com Leão de Ouro no festival de Veneza 2002 teve mais 12 prémios e 12 nomeações nos diversos festivais de cinema. É um filme que me tocou profundamente, porque não está tão longe assim da realidade da minha geração.


sábado, 11 de abril de 2009

Procura-se carne fresca


Quando era miúdo brincava com o meu irmão, fingindo sermos comerciantes. A certa altura, tínhamos uma cadeia de talhos e, com as ferramentas do meu pai, imitando facas e cutelos, cortávamos a carne e aviávamos os fregueses: salsichas, costoletas, bifanas, entrecosto, entremeada, rim, fígado, nada recusávamos servir. Tínhamos balança e o arame para estender a roupa servia para ter a carne pendurada. Escusado será dizer que nem eu nem o meu irmão enveredamos por aquele caminho, felizmente.

Bjarn (Nicolaj Lie Kaas) e Svend (Mads Mikkelsen) tiveram a mesma ideia que eu e o meu irmão, mas desta feita criaram um talho real. Com feitios bem distintos, um com frequente síndrome de inferioridade e o outro que não quer saber de coisa alguma, descobrem a receita ideal para um negócio de sucesso. Esse acaso dá-lhes um objectivo de vida, do qual eles não se conseguem livrar, ou estariam a arriscar o negócio em ascensão. Leva-nos a pensar até que ponto estaríamos dispostos a ir para vingar profissionalmente ou para manter o sucesso alcançado. Oh vida a quanto obrigas!


Anders Thomas Jensen, realizador dinamarquês presenteia-nos com uma comédia cheia de surpresas inimagináveis. “Carne fresca, procura-se” (2003) lembra-me um pouco a maravilhosa sensação que tive quando vi “Delicatessen”. A ele voltarei.

quinta-feira, 2 de abril de 2009

Vai um cigarrinho?

Fumador me confesso. Dois maços por dia. Eu sei que é demais e não deveria sequer fumar mas, existem momentos na história da minha vida que, sem um cigarro, não eram a mesma coisa. Muitos dos que fumamos não nos sabem a nada e mesmo alguns não sabem bem. Porque o fazemos? Aí entra o chamado vício. Vício esse que não me deixa sequer acabar este texto sem antes fumar uma grande cigarrada. Mas há mais, pego no telefone acendo um cigarro. Entro no carro... mais um cigarro. Um copo de whisky, um cigarro. Um café... sem cigarro?

Nick Naylor (Aaron Eckhart) defende os interesses de uma grande tabaqueira e é dos melhores naquilo que faz. No começo do filme convence uma plateia inteira que ninguém da sua empresa, quer que aquele miúdo que está ao seu lado com cancro nos pulmões, por fumar há alguns anos, morra. Estariam a perder um cliente.

"Obrigado por fumar" pode classificar-se como comédia/drama visto que nos leva, a brincar, ao mundo do tabagismo e das suas consequências. Carregado de estrelas, este filme realizado por Jason Reitman em 2005, o mesmo que viria a realizar "Juno" dois anos mais tarde tem para mim uma frase que descreve bem as pessoas que vencem no mundo dos negócios. Quando o filho lhe pergunta porque é que o pai faz o que faz, ele responde-lhe que só o faz para pagar as contas. E como o faz é simples, a pessoa tem sempre razão basta que argumente melhor que o outro.

Isto é um sonho!

Todos nós temos um sítio especial e diferente onde nos escondemos. Mas existe um sítio comum a todos, na nossa mente, quando sonhamos acordados. Lá dentro podemos ser o que quisermos sem medo de críticas ou reprovações. Podemos idealizar o que quisermos, podemos ir onde o sonho nos levar. Podemos imaginar qual a reacção de uma certa pessoa num determinado momento e, a partir daqui, podemos conscientemente prever a nossa própria reacção a esse momento.
Este nosso domínio desaparece a partir do momento em que passamos a um estado inconsciente, onde deixamos de comandar para ser comandados, onde estamos realmente a sonhar. Ou não? O que acontece se a linha que separa a realidade do imaginário não fôr assim tão clara?

Michel Gondry, realizador de clips musicais tem na “La Science dês Rêves” (2006) (A Ciência dos Sonhos) mais uma longa metragem. Ele cria um imaginário na personagem de Stéphane (Gael Garcia Bernal) onde representa os sonhos como se fossem passados num canal de televisão. Aqui os sonhos são trabalhados como se de uma verdadeira ciência se tratasse. Os sentimentos dele em relação à mãe, ao padrasto, ao pai, aos colegas de trabalho e às pessoas por quem se apaixona, são aí debatidos e explorados.

Banalidades

Imaginem-se assassinos. Qualquer um o pode ser. Para isso basta um punhal, uma faca, uma pistola ou uma espingarda enfim, uma arma que faça o serviço. Mas mais importante que isso… nervos de aço. Mas vamos imaginar que têm tudo isto e saiem para a rua preparados para matar. Encontram o vosso alvo e BUM. Está feito. E agora? O que fazer com o corpo que jaz no chão sem vida?

Ben (Benoît Poelvoorde) vai mostrar-nos não só a melhor maneira de “despachar” uma pessoa, como também nos ensina a fazer desaparecer o cadáver ensanguentado. Cada caso é um caso, dirá ele. Vai depender do tipo de defunto. Se é alto, baixo, anão, magro, gordo, se sofre do coração, se é cego, surdo ou mudo, e por aí fora. “Manual de Instruções para Crimes Banais” (1992) (C’est arrivé près de chez vous) Filme do belga Rémy Belvaux.

Aconselho vivamente este filme mas cuidado, pois à medida que o filme vai rodando a equipe técnica vai sendo morta e, a vossa própria percepção do que é ficção vai-se diluindo.

Para além do trailer deste filme, houve um pequeno excerto que, quanto a mim que vi o filme em 1993, marcou a essência do mesmo.